A região do Lago de Como é apontada entre as preferidas dos super-ricos - Imagem: (iStock / domin_domin)
As belas paisagens, os monumentos históricos e a culinária italiana tornam quase impossível não almejar la dolce vita, o estilo de vida italiano. No caso de quem tem dinheiro de sobra, no entanto, não se trata mais de um sonho, mas de um plano concreto. Ao menos é o que mostra o relatório Private Wealth Migration Report 2025, da Henley & Partners, consultoria especializada em programas de cidadania e residência.
Segundo o estudo, a Itália é o país mais atraente para milionários em 2025. Além disso, supera destinos como Emirados Árabes Unidos (2º) e Estados Unidos (3º). A expectativa é de que o território italiano receba aproximadamente 3.600 milionários neste ano, levando ao destino cerca de US$ 21 bilhões (cerca de R$ 113,7 bilhões) em capital privado.
“O estilo de vida italiano reúne elementos que dialogam diretamente com o imaginário de exclusividade: gastronomia e vinhos diferenciados, patrimônio artístico inigualável, clima mediterrâneo e uma das maiores expectativas de vida da Europa. Para os super-ricos, isso se traduz em bem-estar, privacidade e longevidade”, diz Fabíola Tronolone, professora universitária no Senac e no Centro Universitário Belas Artes, especialista em mercado de luxo e host do podcast Luxologia.
Entre os nomes que já adotaram a dolce vita como lifestyle permanente estão Nassef Sawiris, o homem mais rico do Egito e coproprietário do Aston Villa Football Club, e Richard Gnodde, vice-presidente do banco Goldman Sachs.
À frente da concorrência
A escolha da Itália, como aponta a pesquisa, é impulsionada pela instabilidade geopolítica e por mudanças em regimes tributários de alguns países. Essas novas políticas, não têm sido muito favoráveis a quem detêm grandes fortunas. É o caso da Espanha, por exemplo, que aboliu neste ano o Golden Visa. O programa permitia a estrangeiros obter residência legal no país ao realizar grandes investimentos como a compra de imóveis.
A França, por sua vez, considera expandir seu imposto sobre riqueza na tentativa de reduzir o crescente déficit orçamentário do país. Enquanto isso, a Suíça tem avaliado aplicar mudanças no imposto sobre herança.
AU-TO PADRÃO
Já o Reino Unido, aboliu em abril deste ano o regime fiscal chamado non-domiciled ou non-
Mas, afinal, como a tributação italiana favorece os super-ricos?
Em meio a essa perda de atratividade gerada pelas mudanças nos regimes tributários de outros países, a Itália ascende como alternativa competitiva. O segredo está em seu sistema de imposto fixo favorável para novos residentes.
Segundo a Agência Tributária Italiana, o regime de imposto fixo, válido por até 15 anos, permite a novos residentes fiscais que não tenham morado na Itália nos últimos 9 de 10 anos pagarem um valor anual fixo de 200 mil euros (aproximadamente R$ 1,27 milhão) sobre a sua renda obtida no exterior. Já os rendimentos provenientes da Itália, são tributados normalmente.
A política permite ainda adicionar membros da família como cônjuge, filhos, pais e outros dependentes por uma taxa adicional de 25 mil euros por pessoa, por ano.
Curiosamente, em 2024, a Itália dobrou o valor do imposto fixo. De 100 mil euros, ele subiu para 200 mil. No entanto, Matteo Pella, corretor sênior na imobiliária Berkshire Hathaway Home Service, afirmou à CNBC que isso não deixou de atrair os super-ricos para o destino: “É como dizer: ‘hoje seu café custa dois euros e amanhã, serão quatro’. Você não vai abrir mão do seu café”, brinca.
O maior benefício deste imposto fixo é um cenário tributário previsível e atrativo para as famílias que pretendem mudar de país.
Boom no mercado imobiliário e polo de investimentos
Quanto mais ricos na área, mais caros ficam os imóveis. Segundo a consultoria e corretora imobiliária Dreamer Luxury Real Estate, esse fluxo de super-ricos tem sido responsável por um boom no mercado imobiliário italiano.
Imóveis exclusivos, como vilas históricas, propriedades rurais de prestígio e coberturas com vistas únicas, estão sendo negociados entre 7 e 15 milhões de euros. Já os aluguéis anuais das propriedades de luxo mais exclusivas têm chegado a 140 mil euros (o equivalente a R$ 889 mil).

Esse cenário de valorização imobiliária aumenta a relevância da Itália como um importante polo global para investimentos em imóveis de luxo. Residências branded ligadas a marcas de moda e hospitalidade, por exemplo, estão entre os nichos que terão um boom, segundo a especialista em mercado de luxo Fabíola Tronolone.
Além das moradias, a especialista destaca uma série de estabelecimentos e negócios que surgirão em resposta a essa migração dos super-ricos. Entre eles, serviços de concierge focados em wellness e lifestyle em um modelo integrado. O objetivo é garantir a adaptação dos recém-chegados ao destino da maneira mais fluida possível.
Se a mudança é em família, educação de qualidade é fundamental. Por isso, ela aponta ainda o surgimento de escolas internacionais e hubs de educação para famílias expatriadas. A arte não fica de fora: galerias, leilões e feiras de arte contemporânea serão expandidas.
A Bienal Internacional de Arte Contemporânea de Florença destacou, para a edição que acontecerá em outubro, a expansão de formatos expositivos e uma presença ainda maior de artistas de outros países. O governo italiano anunciou ainda, em março deste ano, a fusão entre a Galleria dell'Accademia e o Museo Bargello para criação do maior museu dedicado a Michelangelo.
Quais regiões brilham os olhos dos ricaços?
Milão e as regiões dos lagos ao seu redor têm sido os destinos favoritos entre a clientela da imobiliária Berkshire Hathaway HomeServices. Nestas áreas, como relata o corretor Matteo Pella, o valor dos imóveis tem atingido preços recordes.
Fabíola, por sua vez, confirma a tendência: “A região dos lagos registrou uma valorização imobiliária muito significativa nos últimos anos. Já Milão, é a capital do design, da moda e da inovação, mas também funciona como um hub financeiro internacional e uma localização privilegiada na Europa”.
Para que os destinos acomodem esta parcela da população a longo prazo, ela prevê investimentos em infraestrutura aeroportuária executiva, projetos imobiliários ultra exclusivos e o fortalecimento de serviços como educação internacional. O The Wilde e o Casa Cipriani são exemplos de clubes para associados que abriram em Milão entre 2022 e 2024.

O corretor Matteo Pella também destaca a região da Toscana e cidades como Roma, Veneza e Florença entre as mais desejadas. A pergunta que fica é: como conciliar a atmosfera turística destes locais com a exclusividade tão almejada por este público de alto padrão?
“Esses destinos vêm aplicando políticas seletivas para preservar sua essência. Veneza restringiu o acesso de cruzeiros, Florença e Roma valorizam propriedades históricas transformadas em residências privadas e hotéis de alto padrão, enquanto a Toscana e a Riviera Italiana se consolidam como territórios de slow luxury com hotéis boutique, vinhedos e experiências personalizadas”, conta Fabíola.
Para ela, o segredo está no equilíbrio: enquanto o turismo de massa movimenta a economia, a exclusividade se mantém através do tempo, do acesso restrito e da personalização extrema.
Elite brasileira na Itália
O investidor bilionário brasileiro Fersen Lambranho é um dos que passaram a chamar a Itália de lar. Segundo Fabíola, este pode ser um movimento comum entre os super-ricos do Brasil.
“O fator da cidadania italiana por descendência foi um enorme facilitador, apesar das restrições recentes. Além disso, os brasileiros desse perfil buscam segurança, estabilidade jurídica, sofisticação cultural e uma proximidade emocional com os valores italianos, como família e convivialidade”, conclui.
- Neste ano, a Itália alterou a legislação sobre obtenção da cidadania italiana por descendência. Hoje, a regra vigente restringe apenas a filhos e netos de cidadãos italianos o direito automático à cidadania por descendência, excluindo bisnetos e gerações posteriores.